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Solilóquios de um lavrador.


Faz algum tempo.
Era menino.
Lá estava a família reunida...
__ Filho seu primo da cidade nos visitará na próxima semana. Deve ficar poucos dias.
__ Cidade? Primo? Alguns dias? Mais um...
Aquela semana voou.
Chegou o janota! Balbuciei ao meu irmão Ari. Continuei.
__ Frajolas da cidade são criados como moças.
Logo me respondeu:
Tenha paciência!
Não demorou muito surgiram as comparações. Campo versus cidade. Pelo seu prisma a cidade era o mundo ideal. O mundo dos sonhos, das realizações, do desenvolvimento. Questões que já me causavam dúvidas. Desenvolvimento? Consumo planejado e ritmado, pessoas robotizadas. Achava tudo estranho, mas deixava que ele se deliciasse com o mel do qual era fonte.
Das comparações saiam afirmações, às vezes grosseiras.
Irritava-nos ouvi-lo comentar que a vida no campo era fria e sem sabor (ele não sabia observar o verde dos bosques, o canto dos pássaros...); entorpecia aquele olhar de interrogação sobre nossas tarefas como se não servissem para  nada ou fossem parvoíces (me fazia pensar que homens da cidade não sabiam criar, somente executar e durante um horário determinado).
Felizmente uma semana passa rápido ainda que seja malfadada. O primo partiu.
Com passar do tempo entendemos que é próprio de alguns adolescentes dispensarem do mundo real e fundarem um particular, mas o do primo era soberbo e não reconhecia valor nenhum no nosso (real, árduo, digno e cheio de vida).
Mediante outras vivencias começamos a perceber que o homem da cidade só entende o mundo duma maneira particularizada qual todo movimento encontra-se emulações. Sentem necessidade de vantagem sobre o próximo. Até parece egoísmo, mas nos indica condicionamento purificado no senso comum. Fazendo um paralelo dramático diria que concomitantemente ao prendermos o gado para engorda no campo encontramos equivalência nas cidades quando as fábricas, as indústrias e, principalmente, as escolas condicionam os sujeitos a viverem em função de suas necessidades (não que isso não tenha chegado ao campo, mas lá eles parecem se deliciarem com esse joguete).
Os “cidadãos” amam tanto esse jogo de manipulação que quando estão fora dele ficam doentes, deprimidos ou desviam sua conduta, afinal a única maneira de ser feliz é ter um emprego e consumir...
Poucos dias nesse meio nos permite certas asserções – não definitivas, mas não menos contundentes aos amantes das metrópoles e sua teatrocracia.
  Diante das relações sociais apesar de agirmos uniformemente nem sempre estamos de acordo (a coletividade desmonta os seres reais e monta pessoas de plástico), os problemas criados pelas circunstancias ou por algum membro em desacordo são transformado em espetáculo dos noticiários de todas as mídias.
Fantasiam uma humanidade para a sociedade. Esta não existe, vivem atras de um espectro icário. 
“Se um dia o homem livra-se do egoísmo” parte destes problemas deixariam de existir, no entanto se não houvesse para que os cidadãos dessem seu infantil riso diante da resolução - do que viveriam as cidades? Suas teatrais Câmaras e Assembléias, cômicas escoltas policiais para larápios do erário, protocolos toscos, porém bem quistos etc. fazem da cidade a "vanguarda do progresso."
A cidade é a fuga de um caos menor para um caos maior equilibrado na coerção das instituições não menos culpadas do caos humano em todos os aspectos (espiritual, financeiro, sociológico) explicado no imbricamento duma vontade de "superação" existente nas relações subjetivas e objetivas de cada indivíduo em vistas ao próximo. Talvez o estruturalismo explique melhor...

Vide parte II.

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